Clique para iniciar atendimento pelo Whatsapp

Hibrys e Os tempos sagrados

Hybris e os Tempos Sagrados

Nos tempos sagrados em que vivemos, em que as transformações estão ocorrendo, não devemos desafiar os deuses, mas sim, encarar nossa evolução e nossos problemas.

Por Marília de Abreu
Wicca Cia das Bruxas

Hybris, hubris ou ainda wybris: palavra de origem grega que significa a soberba humana diante do sagrado.

Assim como tememos um retorno de Saturno ou, numa linguagem comum, uma grande crise que, passada, torna-se uma lembrança enriquecedora e às vezes até feliz – conforme tenhamos vencido alguma fraqueza, medo ou dor –, a sociedade também receia os períodos de transição de um ciclo evolutivo para outro que marcam fases para um maior amadurecimento coletivo.
Nós, bruxos, chamamos a todo tipo de limiar de “entre mundos”, seja o limiar do amanhecer, o momento da Lua Cheia, de tempo, de idade, de processo psicológico, o “entre mundos” dos vivos, dos mortos, ou mesmo um limiar físico.
Sabemos que em todos eles existem características mágicas, uma intemporalidade, uma centelha de magia; algo deixa de ser o que era para ser outra coisa. Costumamos considerar os limiares momentos ou “espaços sagrados” que nos remetem a uma profunda reflexão do que já não é mais e uma expectativa do que virá a ser, pois sabemos que contêm todas as possibilidades nas quais o livre-arbítrio governa soberano, e a vontade tem mais espaço para ser exercida. Porém, o “entre mundos” não é nem um espaço, nem um momento que nos pertença. Pertence, sim, às divindades e ao plano espiritual, de forma que nossa aproximação é solene e reverente. Todo limiar é sagrado.
Mas não é preciso ser bruxo para saber que estamos num limiar evolutivo, no fim de um mundo ou de uma visão de mundo ou, talvez, como diriam os espíritas, transição de mundo de expiação para de regeneração ou Era de Aquário.

Para os mais céticos, poderíamos colocar da seguinte forma: houve uma escolha, um caminho, valores e um estilo de vida que estão hoje atingindo seu apogeu com a concretização dos ideais almejados. E também algumas conseqüências negativas. É um ponto a partir do qual ou há uma transformação ou tudo começa a ruir, pois a própria “engrenagem” começa a corroer e a destruir a si mesma. Um exemplo disso é a crise ambiental. Mesmo os mais pragmáticos conseguem enxergar esse limiar, mas nem todos sabem como lidar com ele.
Na vida da pessoa comum, os sinais dessa transição podem ser sentidos como:
– sentido de urgência (algo que não é pessoal);
– sensação de que o tempo transcorre mais depressa e/ou em alguns momentos para, dando-nos uma chance de rever, avaliar melhor ou prestar mais atenção a algo;
– transformações – tecnológicas, de hábitos, moda, valores, conceitos etc. –, ocorrendo de forma mais acelerada, o que também traduz um senso de urgência, só que coletivo; é como se houvesse um acordo, e a humanidade decidisse fazer um esforço-tarefa para cumprir metas e encerrar um ciclo;
– sensação de que algo esteja para acontecer, trazendo certo pânico ou ansiedade;
– sensação de que alguns projetos já perderam a vez de acontecer;
– tendência a acordar por volta das quatro da manhã, ficar bem desperto por alguns minutos, e depois dormir tranqüilamente, sinalizando que não se trata de insônia, mas de uma característica meio atemporal, própria do “entre mundos”.
Todas essas sensações são percebidas. Contudo, só quando as pessoas descobrem que outras também as têm é que surge a percepção de se tratar de algo coletivo e podem ficar alarmadas.

Outra característica desse tempo é que o conceito do “aqui se faz, aqui se paga”, carma ou lei de causa e efeito, está instantâneo – é o que os místicos chamam de “carma do agora”, um sinal de que devemos colocar sebo nas canelas no processo evolutivo; não porque o mundo vá acabar, mas para que passemos juntos para a próxima etapa.
Quando digo “juntos”, quero dizer que evoluímos individual e coletivamente; cada ponto positivo individual conta pontos para nosso “grupo de alma” e, evoluindo coletivamente, avançamos coletivamente para estados físicos, mentais e espirituais mais elevados.
Só que nesse ponto encontramos uma barreira: a visão de mundo criada pelas tradições e filosofias que, até então, marcaram nossa caminhada, não permite essa passagem de nível. Primeiro, porque o espiritual e o material se contrapõem, superior contra inferior, condição hierárquica que possibilitou a criação de regras de conduta, de valores e de costumes que foram muito eficientes, colocando algum freio numa humanidade ainda adolescente; segundo, porque mantendo o rebanho num padrão mediano, existia pouco espaço para o desenvolvimento da individualidade.
Da dificuldade em conciliar o espiritual e o material resultaram problemas na convivência com os recursos materiais, fossem eles o próprio corpo, os da natureza, as riquezas etc. Desenvolveu-se uma dicotomia no comportamento: “bonzinho”, quando o assunto era espiritual; voraz, quando era material. É uma certa hipocrisia que custou caro à humanidade, como no caso da crise ambiental, de valores e psicológica.
O cabedal filosófico tinha essa fenda, inofensiva e imperceptível no começo, mas bastante grave para o momento atual, criando uma crise existencial sem precedentes, pois nos foi negada a possibilidade de transcendência.

A negação à transcendência é não dar a possibilidade de “passarmos de fase”. Os poucos que o fizeram até então ou foram considerados santos ou foram queimados, conforme suas opiniões coincidissem ou não com as da ordem vigente. Considerando-se, ainda, que essa transcendência ocorria pelos méritos e esforços pessoais, pois não havia treino, preparo ou mesmo o conceito. Na verdade, a passagem de fase só poderia ocorrer pela morte.
Assim, quem ainda não questionou a estrutura espiritual e não encontrou caminhos que possibilitem a individuação, a expansão da consciência e a transcendência, hoje em dia está vivendo um momento muito difícil. Vejam, por exemplo, o crescente aumento de problemas mentais, do uso de drogas, de álcool etc. Para os que não chegaram ainda nesse ponto, há o estresse profissional, os relacionamentos doentios, a dificuldade em acompanhar a busca desesperada por informação e a falta de critérios para selecioná-la. Isso ocorre porque o potencial individual não é levado em consideração, criando uma dissociação entre corpo, mente e espírito, num momento em que são necessárias soluções individuais.
Assim, restam três saídas: negar de vez o espiritual, aferrando-se ao materialismo; apegar-se ainda mais a grupos fundamentalistas, achando que a solução é voltar para o passado ou procurar novos conceitos que possibilitem o avanço, que coloquem o espiritual como superior abrangente e não excludente.
Nós, bruxos, optamos pelos valores da cultura celta, por ela ter maior consonância com a cultura ocidental, sem desprezar o cabedal filosófico da cultura oriental, em que o contexto é outro. A tradição oriental também propicia a transcendência, só que suas práticas, quando aplicadas por ocidentais, não raro causam distorções; nós, ocidentais, nos acostumamos a lidar com o aspecto espiritual de modo pragmático e um tanto hipócrita, coisa que não acontece na sistemática celta.

Acreditamos que forçar as pessoas a ter consciência, seja ecológica ou qualquer outra, sem dar-lhes a perspectiva dessa consciência, é como forçar alguém a ser generoso apontando-lhe uma arma. As pessoas até podem fazer coisas por desespero, mas não estão “presentes” integralmente enquanto o fazem, não estão conscientes. Sem a possibilidade de integrar a vida em seus múltiplos aspectos e transcender para uma perspectiva mais abrangente, o que for feito o será de forma inconsciente, e não é possível passar para a próxima etapa desta forma.
Vivemos tempos sagrados, e esse “território” pertence aos deuses. A nós é permitido apenas usufruir da mais pura magia para fazermos escolhas, reencontrarmos nossos pares, fazermos o balanço do que foi útil e bom e que não será mais, cuidarmos para o que é precioso continue precioso – seja uma bela paisagem, animais, tecnologia, amor. Enfim, é a síntese de uma fase evolutiva. Devemos prestar contas daquilo que fizemos de melhor, incluindo como administramos e zelamos pelo mundo que nos foi entregue para sermos seus guardiões. Ter consciência deste momento é, por si só, um ato solene.
Porém, termos pessoas lutando para voltar ao passado, cegos guiando cegos, inconscientes querendo se apegar a um sistema que já não é mais, outros enlouquecidos procurando algo que nem sabem o que é e negar-lhes a consciência e a possibilidade de transcendência, é hybris, desafio aos deuses.
Os tempos sagrados emprestam sua magia aos homens que, achando-se possuidores desse dom, sentem-se poderosos, inconscientes que são da verdadeira essência desse poder, e julgam-se no direito de afrontar os desígnios e as leis divinas.


Wicca Cia. das Bruxas www.wiccaciadasbruxas.com.br

 

Rolar para cima